quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

O amor é...Uma paçoquinha



Não fuja. Não fuja dos sentimentos. Sejam eles quais forem. Bons ou ruins. Porque eles são a única coisa que realmente valem nessa vida.
Tua casa, tuas roupas, teus bens, teu status, teus títulos e diplomas, tudo o que você conquistou ou tudo o que lhe foi dado, não importa. Tudo vai acabar um dia, vai ser repassado, vendido, carcomido, vai virar pó, vai ficar ultrapassado, vai virar espólio. As pessoas e criaturas que você ama, teus amigos, tua família, teu cachorro, teu gato, tua tarântula de estimação, tuas plantas, tudo vai ter um fim.
Tratam-se de seres vivos e seres vivos estão sempre em movimento, de um modo ou de outro, quer você queira ou não, quer você aceite isso ou não, quer você perceba ou não, quer você entenda ou não. Seres vivos morrem, adoecem, padecem, mudam. Vão embora. E sentem. Portanto, se você é um ser vivo, aja como um: sinta enquanto é tempo. Sinta tudo a sua volta ao máximo, pessoas e coisas, enquanto ainda detiver a doce ilusão de possuí-las, enquanto ainda estiverem próximas a você.
Sinta seus odores, bons ou ruins, a textura de suas peles, de seus pêlos, de seus cabelos, a falta deles, a curva de seus lábios, de seus ombros, a forma de seus dedos…repare no brilho de seus olhos, nos movimentos de seus corpos, no arqueamento dos cílios…observe quando andam, quando se deitam, quando correm, quando dormem….ouça a ternura de suas vozes, o timbre diferenciado de seus sons…do latido, do miado, do gemido, do suspiro, do grito, do sussurro, do choro.
Prove o gosto único da saliva, da lágrima, do gozo, do suor… sinta o doce calor do bolo quente, o salgado sangrento da carne, o amargo abrasador da bebida o ácido corrosivo da fruta.
Deixe que o vento desarrume os cabelos, bagunce a roupa, espalhe os papéis, abra as janelas, feche as portas, desfolhe as árvores, levante telhados, derrube objetos… ouça o que ele diz, as coisas que ele traz de tantos lugares diferentes e inimagináveis os quais talvez você nunca, jamais poderá visitar…repare como ele também se movimenta..às vezes com doçura, às vezes com fúria. O vento também sente. Sinta-o de volta.
Ame. Ame, ame, ame. Perdidamente, loucamente, intensamente, com todas as suas forças. Apaixone-se. Encante-se. Enleve-se, Maravilhe-se. Iluda-se. Voe. Flutue. Doe-se total e incondicionalmente. Sorria. Gargalhe. Embriague-se. Impregne-se. De bebida, de amor, de prazer, de alegria, de amizade, de contentamento, de orgulho, de bondade, de júbilo, de existência. De momentos.
Odeie. Pragueje, esmurre, destrua, queime, arda,absorva, xingue, amaldiçoe, abomine, execre, deteste, grite, brigue, esbraveje. Expurgue. Consuma-se até não sobrar mais nada disso em você.
Entristeça-se. Chore. Queixe-se, lastime-se, reclame, deplore, constranja-se. Perca-se de si mesmo. Mergulhe no lago glacial da angústia…aquele que fica no poço escuro da auto-comiseração. Vá até o fundo. Fique ali, imerso, estático…entre em apnéia.
Feche os olhos… tenha vontade de morrer. De nunca ter nascido. Lamente. Por ter tentado, por nunca ter tentado, por ter ido, por nunca ter ido, por ter conhecido, por nunca ter conhecido, por ter se envolvido, por nunca ter se envolvido, por ter escolhido, por não ter escolhido, por ter feito, por não ter feito, por ter falado, por não ter falado… arrependa-se. Do que fez, do que não fez, do que poderia ter feito…. Sorva seu próprio veneno.
Envergonhe-se. Olhe nos olhos da desilusão, ouça o riso sarcástico da impotência, resigne-se com a indiferença da total falta de controle sobre tudo e todos, sobre si mesmo… e pranteie. Pranteie até desfalecer.
Olhe para a casa vazia, a cama vazia, a vida vazia, o coração vazio a alma vazia e encha-a, encha-a de melancolia, de desgosto, de decepção, de revolta, de confusão. Entranhe-se. Estranhe-se. Feche-se. E purgue, expulse tudo isso de sua alma. Vomite. Expie. Limpe-se. Purifique-se, como num batismo…e então, VOLTE.
Volte…volte… nade aos poucos para a superfície…porque você precisa de ar, de luz, porque já não é mais a mesma pessoa e as coisas já não são as mesmas. Porque seu tempo ali acabou, como tudo acaba um dia. Nade, esforça-te…ponha a cabeça para fora… Aspire! Inspire! Grite. Encha os pulmões de ar até senti-los doer. Você está vivo, afinal. Está de volta e pronto para encarar tudo de novo…Isso é viver. Isso é sentir. Isso é ser… humano.
No dia quem você passar para o outro plano, morrer, vestir o terno de madeira, ir pro céu, pro paraíso, para a luz, virar poeira, desaparecer, ir pro inferno, pro sheol, pro valhalla, desencarnar, sabe-se lá-no-que você acredita ou não acredita, não haverá nada terreno ou material que você poderá levar, NADA. Você vai exatamente como veio. Nu, em todos os sentidos. Exceto por sua alma.
E ela é o templo dos sentimentos. O baú onde eles estão guardados. É isso que vai sobrar, no final.
As lembranças, a experiência. O que ficou registrado de tudo o que viveu. O que fez sua vida valer a pena. O que vem depois disso ou o que você vai fazer com isso é outro assunto…e eu sinceramente não sei, nem me preocupo muito. A única coisa que gostaria de dizer é apenas: sinta.
“Não se preocupe em entender. Viver ultrapassa todo o entendimento” -

Clarice Lispector

2 comentários:

Anônimo disse...

Eu ja tinha lido antes esse texto, mas li agora e de uma forma diferente de pensar na vida!
É isso ai, perfeito!!

Anônimo disse...

Eu ja amava Clarice, lendo esse texto então, nossa..... realmente perfeito......sem palavras...